sábado, 26 de julho de 2014

Resenha: As Memórias do Livro, de Geraldine Brooks


Geraldine Brooks propôs algo super original: Uma história que conta, literalmente, as memórias de um livro, ou parte do que ele já passou durante a sua “existência”.

Hanna, uma australiana especialista em conservação e restauração de livros (profissão que, apesar de verossímil, foi parcialmente inventada pela autora, não existindo da forma exata como é contada na história) foi convidada para examinar um livro em Sarajevo, capital da Bósnia, onde ele foi reencontrado depois de anos desaparecido por causa dos conflitos do país. O livro agraciado nessa história é a Hagadá, um manuscrito judaico que existe e que realmente sobreviveu durante séculos, mesmo passando por épocas de censuras e de perseguições contra os seguidores da religião.

Quando a restauradora pode ver o livro de perto, depara-se com enigmáticos fragmentos de insetos, grãos de areia, líquidos coloridos, dentre outras coisas.  Então, sucedem-se capítulos de investigação da profissional para desvendar os mistérios do passado do livro, alternando-se com capítulos de histórias (evidentemente fictícias) que contam como houve contato entre as páginas e as tais substâncias. Tudo isso resultando no estado físico final do livro. Trata-se de suas memórias!

Nas partes da história concernentes à investigação, o  leitor é levado a conhecer um pouco sobre Hanna, com destaque para seu relacionamento com a mãe e para seus dilemas profissionais e amorosos. Tudo o que se passa com a protagonista do livro tem altos e baixos de dinâmica. Algumas passagens são pouco envolventes, por não serem muito bem contextualizadas e por não serem muito bem escritas. Há poucos momentos de Hanna que empolgam, mas alguns, ainda assim, muito bons!

Além disso, a personalidade dos personagens desses trechos são pouco estruturadas, suas características pessoais são ditadas de forma direta, ou seja, não os conhecemos por meio de demonstrações, mas por apresentações.

Quanto às histórias diversas que acompanham a trajetória da Hagadá, pode-se dizer que esbanjam criatividade (ostentação total rsrs)! A autora deu laços e nós cegos na “vidinha” desse livro! Cada passagem mostra pessoas diferentes, em ambientes diferentes, com culturas diferentes e vivendo em épocas diferentes, tratando do livrinho segundo suas normas.

Por dádiva das “lembranças” da Hagadá, "As Memórias do Livro" possui uma certa riqueza cultural! O livro abrange estilos de vida, nacionalidades e religiões diferentes, além de dar uma pincelada nos conflitos Bósnios. Pela naturalidade com que essas diversidades são tratadas, o livro pode ser considerado um combatente de diversos tipos de preconceito, principalmente da intolerância religiosa, da misoginia e da homofobia.

A escrita do livro não é das melhores, sendo algumas vezes pouco clara e outras, contraditoriamente, prolixa. Além disso, não possui muitas marcas de personalidade da autora nem originalidade, deixando a desejar no quesito criatividade. É evidente que a questão da escrita ser boa ou ruim fica a critério de cada leitor, muitas pessoas consideram que As Memórias do Livro é bem escrito. Não deixemos de considerar, também, que isso pode ser uma consequência de uma tradução ruim. 

A conclusão é:

O livro é original, interessante e inovador quando conta a história da Hagadá. Seu foco, afinal, é contar o que aconteceu com o livro judaico, e não falar sobre Hanna, nem tampouco criar personagens complexos e cativantes.

A originalidade do conteúdo supera a escrita ruim e as partes monótonas, por isso, pessoalmente, o saldo dessa leitura foi muito positivo!

Recomendo para aqueles que não se importam tanto com a qualidade da escrita e valorizam mais o conteúdo, para os que gostam de livros ricos culturalmente e para quem busca uma leitura de passatempo!

Depois dessa leitura, dá uma vontade de valorizar as marcas de uso dos nossos livrinhos: as manchinhas, os risquinhos, os arranhões...



 - Beatriz Marques.

terça-feira, 22 de julho de 2014

Resenha: Garota Exemplar, de Gillian Flynn.

Apesar do título de “romance adolescente”, Garota Exemplar está bem longe desse gênero. Apesar de muitos o classificarem como suspense, talvez a classificação mais apropriada seja a de drama. 

Garota Exemplar é o livro mais recente da norte-americana Gillian Flynn, ela também já publicou mais dois livros: “Na própria Carne”, seu romance de estreia, e “Dark Places”, ainda sem versão no Brasil.

O título pode parecer estranho de início, principalmente por teoricamente ser um suspense, mas, assim como o restante do livro, foi incrivelmente bem pensado pela autora.

O livro conta a história do desaparecimento de Amy Dunne no dia do seu aniversário de casamento. O desaparecimento dela é envolto em uma série de mistérios, de fatos e pistas estranhas que não se encaixam e que, posteriormente, viriam a incriminar o seu marido, Nick. O caso vira rapidamente notícia nos mais diversos jornais, principalmente pelas atitudes estranhas de Nick. A polícia descobre, no curso de sua investigação, que alguns dias antes de desaparecer Amy apresentava um comportamento estranho e, assim, a suspeita passa a recair sobre o marido. 

Confesso que logo de início me surpreendi com o livro, ao ler a sinopse imaginava estar diante de um livro de suspense policial, assim como os da Agatha Christie, ou para citar autoras mais recentes Camilla Läckberg. Logo percebi que não seria muito como esperava. Ao trazer uma narração em primeira pessoa, mas que varia entre o ponto de vista de Amy e de Nick, a autora traz algumas dicas para tentarmos adivinhar o que aconteceu com a mulher. Entretanto, faz além, ela consegue desenhar todo um perfil psicológico dos personagens. É justamente essa análise que os diferencia dos típicos suspenses policiais e o transforma, pelo menos em meu ponto de vista, em um drama. Um drama que tem como plano de fundo o desaparecimento de uma mulher. Um drama que fala, em realidade, sobre relacionamentos. 

Várias pessoas comentaram que este livro conta a história de um casamento.  Inclusive o “subtítulo” pode passar essa impressão: “Garota Exemplar: O casamento mata”. Porém, casamentos não são tão disfuncionais quanto o de Amy e de Nick. E se você, ao final do livro, ainda tiver a ideia de que ele é um “retrato sobre casamento”, temo informar que você tem ideias medonhas sobre o instituto do matrimônio. 

A autora é genial ao mudar, a cada capítulo de ponto de vista. Em um capítulo estamos lendo o diário de Amy, em outro o diário de Nick. Além de nos mostrar uma imagem completa do que se passa na cabeça dos dois, ela ainda se utiliza do artifício para dar algumas pistas sobre o desaparecimento da mulher. Mas a perspicácia da autora está além, ela consegue nos fazer identificar e sentir simpatia por um dos personagens principais e, no capítulo seguinte, odiar completamente esse mesmo personagem.

Em razão disso, em vários momentos passamos a nos perguntar: Amy desapareceu ou Nick a matou? Será que Nick matou mesmo Amy? E no capítulo seguinte pensamos: Não, ele não seria capaz de fazer isso. É esse joguinho mental que faz com que o leitor se sinta preso ao livro. Conseguimos vivenciar a confusão dos envolvidos porque também nos sentimos confusos.

Entretanto, falha a autora ao não conseguir segurar essa atmosfera por muito tempo. Durante o início do livro, após o desaparecimento de Amy, a autora consegue criar uma antipatia tão grande em seus leitores com relação à figura do Nick que, nos capítulos de seu diário, sequer temos interesse em acompanhar. Sem trazer informações novas, com o diário de Nick sendo extremamente tedioso, sem personagens carismáticos, a autora consegue fazer com que o interesse do leitor suma, isso antes de sequer chegar à página 100. 

Incomoda, também, principalmente para leitores mais atentos e apaixonados por escrever, como a autora não varia a linguagem ou a forma de escrita ao mudar de um capítulo de diário do Nick, para o de Amy. Quem escreve há um pouco mais de tempo sabe que cada pessoa no mundo tem um jeito único de escrever. Certos autores se utilizam mais certas palavras, outros preferem começar uma narração de uma maneira diferente, etc. Por isso que muitas vezes quando lemos muitos livros de certos autores, ficamos acostumados com seu jeito de escrever. É de se espantar o fato de que a autora, por mais que seja uma escritora profissional, não pensou em modificar o jeito de escrever de Nick e de Amy. Se é possível notar a variação de humor e de personalidade, isso se dá somente por causa da narração. Por exemplo, em seu diário, Nick tenta fazer, por várias vezes humor – e claramente não consegue. Ao passo que Amy consegue descrever sentimentos muito mais facilmente. Entretanto, na forma de escrever, ambos são iguais! Utilizam-se das mesmas expressões, e até mesmo do uso contínuo de frases curtas. 

O livro se torna novamente interessante após uma série de revelações, que dão um novo impulso à trama. Um pouco antes da metade do livro pensei em desistir da leitura, não havia qualquer perspectiva de mudança, qualquer indício de chegada de um clímax. Mas a autora consegue, de uma hora para a outra, transformar novamente a história em uma interessante. Ela soube exatamente quando e como utilizar as surpresas do livro, fazendo com que, de repente, o leitor consiga compreender que a trama não mais continuará do mesmo jeito.

É possível notar que, já perto do final, vários personagens secundários – mas ainda assim importantes - somem. Não sabemos mais sobre o paradeiro dos pais de Amy, ou sobre a vizinha Noelle Hawthorne. A autora que pareceu pensar em cada mínimo aspecto da história parece falhar nesse momento: demonstra até mesmo certo despreparo. Ou ela não soube desenvolver muito bem o final, ou não soube começar de maneira apropriada. 

Há também uma discussão sobre o final do livro, quase um “ame-o ou odeio-o”. Alguns consideram um anticlímax, outros consideram que o final foi merecido, já que conta uma história de autodestruição. Não acho que exista uma teoria correta: porque não poderia ser um final merecido, mas que acabe com um anticlímax, até mesmo de maneira proposital? Surpresas e reviravoltas tem de sobra no livro, o final se adequa de uma maneira perfeita, finalizando toda a teoria que foi desenvolvida durante o livro: de um relacionamento tóxico, autodestrutivo, ou como eles mesmo dizem: nuclear. E, por mais estranhas que tenham sido as escolhas dos personagens, entendemos suas motivações.



P.s.: Para quem não sabe, dois dos três livros da autora vão virar filmes. “Dark Places” estreará em setembro, nos Estados Unidos, previsto para estrear no Brasil somente em novembro de 2014. O filme tem um elenco de peso, como Charlize Theron e Chloë Grace Moretz. 

O segundo livro a virar filme da autora é justamente Garota Exemplar! Estreará aqui no Brasil em outubro de 2014, será dirigido pelo David Fincher, e terá Ben Affleck, Rosamund Pike e Neil Patrick Harris. 
Quem quiser conferir, aqui está o Trailer do filme Garota Exemplar!  

   - Mariana Estrela.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Resenha: Barba Ensopada de Sangue, de Daniel Galera.

Daniel Galera é um escritor e tradutor paulista. Tem atualmente 4 livros publicados, sendo alguns deles premiados, inclusive o Barba Ensopada de Sangue, que ganhou 3ª colocação no Prêmio Jabuti e o Prêmio São Paulo de Literatura em 2013. É considerado uma das revelações brasileiras em atividade.

Na capa foi feito um trabalho interessante e bem chamativo, tem inclusive uma textura diferente, parece um pouco com borracha. Só para não haver confusões, esse livro TEM MESMO 3 CAPAS. Não são 3 volumes, é o mesmo livro, mas com 3 possibilidades de capa. É um desenho só, mas com o fundo azul, verde ou vermelho que foram distribuídos aleatoriamente entre as livrarias.

Sobre o título, vale ressaltar que pode causar impressões equivocadas, porque pode levar alguém a pensar que se trata de uma história violenta, mas não é bem assim. Só se descobre o porquê dessa escolha no fim do livro e não há como relacioná-lo com a história (sim, isso é quase um "morra de curiosidade"). Particularmente, não gostei do motivo do título, me pareceu meio aleatório.

O enredo gira em torno de um esportista que decide se mudar para a praia de Garopaba, pequeno município de Santa Catarina. Entre outros motivos, a mudança objetiva investigar sobre o caso mal resolvido do assassinato do avô do personagem, que aconteceu nessa mesma cidade na década de 60 e que mais se assemelha a uma série de lendas ou invenções do povo, não havendo fatos concretos a respeito dessa morte. O professor de educação física passa a reconstruir sua vida na cidadezinha, conhecendo novos amores, novos amigos e também inimigos.

Os personagens se mostram bem planejados, sendo em alguns momentos quase palpáveis. Gente comum, com problemas conhecidos. Não chegam a ter uma complexidade enorme, mas considerável e bem acima da média. É interessante que todos seguem a própria ética no desenrolar do livro, não havendo marcas de moralismo ou códigos de conduta. Só o comportamento natural e humano. Houve uma certa quebra do comum nessas construções, resultando em algo muito original.

A história é bem moderna (também pelo que foi dito no parágrafo anterior), acontece por volta de 2008. A escrita é direta, sem rodeios e sem pudores e é bem característica com relação à fala da região. O nome do personagem principal jamais é revelado durante a leitura, talvez pra universalizá-lo, afinal, ele é uma pessoa qualquer. O personagem sem nome é cativante, ele é simples e  aceita a todos como são, sem julgar ninguém. Ele ajuda a qualquer um sem pedir nada em troca e mesmo assim, não é um personagem "bom moço" convencional, o que o torna mais original e mais interessante.

Esse livro é surpreendente por possuir uma abrangência cultural que o torna uma leitura bastante enriquecedora. Além disso, ele leva a uma familiarização com a pequena cidade, mostra os seus problemas e suas qualidades, mostra como as pessoas vivem e adquirem suas rendas e mostra também as superstições locais. Pra quem já frequentou alguma cidade cheia de superstições no Brasil, é interessante ver isso sendo retratado.

Por fim, eu recomendo esse livro, achei uma leitura agradável e divertida. Queria dar um conselho pra quem ainda não leu: assim que acabarem de ler o livro todo, releiam o texto em itálico que tem antes da parte um do livro (prólogo)!

  - Beatriz Soares.

domingo, 13 de julho de 2014

Blog à Distância: Apresentação


Não consigo me lembrar de quando exatamente me apaixonei pela leitura. Sequer lembro o primeiro livro que li. Ler para mim foi e ainda é uma coisa natural.
Sequer poderia qualificar a leitura em minha vida, poderia dizer que os livros acompanharam todas as fases da minha vida, crescendo comigo, amadurecendo. Poderia dizer que em momentos tristes me refugiava em histórias que me tirassem da minha realidade. Poderia dizer que quando me sentia sozinha, encontrava amigos nos personagens. Poderia dizer que nos momentos felizes, parecia ir aos livros em uma tentativa de talvez amplificar a minha felicidade, encontrando meus “amigos” personagens, conhecendo lugares novos, indo do sobrenatural ao hiper-real em questão de horas. Poderia exemplificar cada parte da minha vida em que meus livros estiveram presentes e, ainda assim, não poderia abranger à importância da leitura na minha vida.
Talvez como uma consequência natural de ler, veio também o amor por escrever. Em minha pré-adolescência escrevia romances bobos para as amigas. Durante toda a minha vida escrevi meus sentimentos, não como um diário, não descrevia meus dias ou sequer mantinha uma linha temporal. Escrevia quando tinha vontade de desabafar, para que talvez uma “eu” do futuro lesse e entendesse minhas frustrações da época. Escrever é quase um processo de auto-conhecimento para mim.

Mas agora vamos às apresentações, me chamo Mariana, e quase de forma natural, resolvi escolher uma profissão que envolvesse os dois: leitura e escrita. E hoje sou estudante de Direito. Conheci minha companheira de blog, Bia, quando estávamos no jardim de infâncias. Obviamente, nenhuma das duas lembra desse fato, mas nossas mães nos fizeram o favor de relembrar. Posteriormente, a Bia foi morar na França, ainda criança (eu sei, très chiq!). Nós separamos momentaneamente, e voltamos a estudar juntas no ensino fundamental. Ambas crianças e pré-adolescentes esquisitas, ficamos amigas. Descobrimos mais tarde que compartilhávamos do mesmo amor pela leitura, somente fortalecendo nossa amizade.

Hoje ela novamente me abandonou e está morando no Rio de Janeiro, estudando para entrar também no curso de Direito, decidimos criar esse Blog não só porque somos duas chatas quando se trata de livros, mas também uma maneira de manter nossa amizade ainda mais forte.

Se você leu até aqui, primeiramente, muito obrigada! E espero que você goste :) Sinta-se a vontade para comentar, discordar e sugerir livros.

  - Mariana Estrela.




Queria dizer também que a leitura acompanhou todas as minhas fases, mas isso não é bem verdade! Tive fases revoltadas com a vida, fases desconcentradas, fases de não compreender o que leio e as piores de todas: fases de estudar apenas ciências exatas e esquecer de qualquer forma de arte. Agora, um pouco menos infantil, estabeleci meu amor pela leitura de uma vez. Ele sempre existiu, só foi muitas vezes reprimido  ou deixado em segundo plano.

Enxergo na leitura uma forma de vivenciar realidades que nunca serão minhas concretamente, possibilidades de conhecer e compreender melhor o comportamento humano, conhecer culturas completamente diferentes da minha, expandir meus raciocínios, ter visões mais abrangentes em muitos aspectos e me fazer alguém mais feliz. Os livros são uma fonte inesgotável de prazer e satisfação pra mim!

Evidentemente, nem todos os livros valem a pena de serem lidos por todo mundo. Cada pessoa tem seus gostos e alguns gostam de ter um direcionamento antes de começar uma leitura. Por isso, me disponibilizo para dar opinião, ouvir discutir literatura!
Quanto a Mariana, minha amiguinha chatinha com livros, assim como eu, posso garantir que confio plenamente nas suas indicações literárias. Assim, nos juntamos para ser beeeem chatas mesmo! E garanto que vocês nunca viram chatice igual! Falamos mesmo quando a coisa não presta! Sem pena! Sem rodeios!

Marii, me empolgo mais ainda com o blog por o estar fazendo junto com você!

 - Beatriz Soares