Garota Exemplar é o livro mais recente da
norte-americana Gillian Flynn, ela também já publicou mais dois livros: “Na
própria Carne”, seu romance de estreia, e “Dark Places”, ainda sem versão no
Brasil.
O título pode parecer estranho de início,
principalmente por teoricamente ser um suspense, mas, assim como o restante do
livro, foi incrivelmente bem pensado pela autora.
O livro conta a história do desaparecimento de Amy
Dunne no dia do seu aniversário de casamento. O desaparecimento dela é envolto
em uma série de mistérios, de fatos e pistas estranhas que não se encaixam e
que, posteriormente, viriam a incriminar o seu marido, Nick. O caso vira
rapidamente notícia nos mais diversos jornais, principalmente pelas atitudes
estranhas de Nick. A polícia descobre, no curso de sua investigação, que alguns
dias antes de desaparecer Amy apresentava um comportamento estranho e, assim, a
suspeita passa a recair sobre o marido.
Confesso que logo de início me surpreendi com o
livro, ao ler a sinopse imaginava estar diante de um livro de suspense
policial, assim como os da Agatha Christie, ou para citar autoras mais recentes
Camilla Läckberg. Logo percebi que não seria muito como esperava. Ao trazer uma
narração em primeira pessoa, mas que varia entre o ponto de vista de Amy e de
Nick, a autora traz algumas dicas para tentarmos adivinhar o que aconteceu com
a mulher. Entretanto, faz além, ela consegue desenhar todo um perfil
psicológico dos personagens. É justamente essa análise que os diferencia dos
típicos suspenses policiais e o transforma, pelo menos em meu ponto de vista,
em um drama. Um drama que tem como plano de fundo o desaparecimento de uma
mulher. Um drama que fala, em realidade, sobre relacionamentos.
Várias pessoas comentaram que este livro conta a
história de um casamento. Inclusive o “subtítulo” pode passar essa
impressão: “Garota Exemplar: O casamento mata”. Porém, casamentos não são tão
disfuncionais quanto o de Amy e de Nick. E se você, ao final do livro, ainda
tiver a ideia de que ele é um “retrato sobre casamento”, temo informar
que você tem ideias medonhas sobre o instituto do matrimônio.
A autora é genial ao mudar, a cada capítulo de
ponto de vista. Em um capítulo estamos lendo o diário de Amy, em outro o diário
de Nick. Além de nos mostrar uma imagem completa do que se passa na cabeça dos
dois, ela ainda se utiliza do artifício para dar algumas pistas sobre o
desaparecimento da mulher. Mas a perspicácia da autora está além, ela consegue
nos fazer identificar e sentir simpatia por um dos personagens principais e, no
capítulo seguinte, odiar completamente esse mesmo personagem.
Em razão disso, em vários momentos passamos a nos
perguntar: Amy desapareceu ou Nick a matou? Será que Nick matou mesmo Amy? E no
capítulo seguinte pensamos: Não, ele não seria capaz de fazer isso. É esse
joguinho mental que faz com que o leitor se sinta preso ao livro. Conseguimos
vivenciar a confusão dos envolvidos porque também nos sentimos confusos.
Entretanto, falha a autora ao não conseguir segurar
essa atmosfera por muito tempo. Durante o início do livro, após o
desaparecimento de Amy, a autora consegue criar uma antipatia tão grande em
seus leitores com relação à figura do Nick que, nos capítulos de seu diário,
sequer temos interesse em acompanhar. Sem trazer informações novas, com o diário
de Nick sendo extremamente tedioso, sem personagens carismáticos, a autora consegue
fazer com que o interesse do leitor suma, isso antes de sequer chegar à página
100.
Incomoda, também, principalmente para leitores mais
atentos e apaixonados por escrever, como a autora não varia a linguagem ou a
forma de escrita ao mudar de um capítulo de diário do Nick, para o de Amy.
Quem escreve há um pouco mais de tempo sabe que cada pessoa no mundo tem um jeito
único de escrever. Certos autores se utilizam mais certas palavras, outros
preferem começar uma narração de uma maneira diferente, etc. Por isso que
muitas vezes quando lemos muitos livros de certos autores, ficamos acostumados
com seu jeito de escrever. É de se espantar o fato de que a autora, por mais
que seja uma escritora profissional, não pensou em modificar o jeito de
escrever de Nick e de Amy. Se é possível notar a variação de humor e de
personalidade, isso se dá somente por causa da narração. Por exemplo, em seu
diário, Nick tenta fazer, por várias vezes humor – e claramente não consegue.
Ao passo que Amy consegue descrever sentimentos muito mais facilmente.
Entretanto, na forma de escrever, ambos são iguais! Utilizam-se das mesmas
expressões, e até mesmo do uso contínuo de frases curtas.
O livro se torna novamente interessante após uma
série de revelações, que dão um novo impulso à trama. Um pouco antes da metade
do livro pensei em desistir da leitura, não havia qualquer perspectiva de
mudança, qualquer indício de chegada de um clímax. Mas a autora consegue, de
uma hora para a outra, transformar novamente a história em uma interessante.
Ela soube exatamente quando e como utilizar as surpresas do livro, fazendo com
que, de repente, o leitor consiga compreender que a trama não mais continuará
do mesmo jeito.
É possível notar que, já perto do final, vários
personagens secundários – mas ainda assim importantes - somem. Não sabemos mais
sobre o paradeiro dos pais de Amy, ou sobre a vizinha Noelle Hawthorne. A
autora que pareceu pensar em cada mínimo aspecto da história parece falhar
nesse momento: demonstra até mesmo certo despreparo. Ou ela não soube
desenvolver muito bem o final, ou não soube começar de maneira
apropriada.
Há também uma discussão sobre o final do livro,
quase um “ame-o ou odeio-o”. Alguns consideram um anticlímax, outros consideram
que o final foi merecido, já que conta uma história de autodestruição. Não acho
que exista uma teoria correta: porque não poderia ser um final merecido, mas
que acabe com um anticlímax, até mesmo de maneira proposital? Surpresas e
reviravoltas tem de sobra no livro, o final se adequa de uma maneira perfeita,
finalizando toda a teoria que foi desenvolvida durante o livro: de um
relacionamento tóxico, autodestrutivo, ou como eles mesmo dizem: nuclear. E,
por mais estranhas que tenham sido as escolhas dos personagens, entendemos suas
motivações.
P.s.: Para quem não sabe, dois dos três livros da
autora vão virar filmes. “Dark Places” estreará em setembro, nos Estados
Unidos, previsto para estrear no Brasil somente em novembro de 2014. O filme
tem um elenco de peso, como Charlize Theron e Chloë Grace Moretz.
O segundo livro a virar filme da autora é
justamente Garota Exemplar! Estreará aqui no Brasil em outubro de 2014, será
dirigido pelo David Fincher, e terá Ben Affleck, Rosamund Pike e Neil Patrick
Harris.
Quem quiser conferir, aqui está o Trailer do filme Garota Exemplar!
- Mariana Estrela.
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